quarta-feira, 30 de maio de 2012

O bom senso é um homem



É impressionante como o movimento "Marcha das Vadias" tem despertado o machismo latente, tão invisível para a maior parte das pessoas. É só uma mulher escrever algumas palavras em seu próprio corpo que é possível perceber uma legião de críticos moralistas se levantando (e pior, muitos deles jornalistas), pra nos pregar sobre "valores". Afinal, que valores são esses? Que noção de certo e errado é essa que falam como se fosse inerente a todos nós, portadores do tal "bom senso" supracitado? 
Eu, pelo menos, não concordo (ou nasci sem a minha razão, a famosa inspiração quase divina que nos orienta para o que é bom). Não concordo mesmo com valores que pregam que o respeito não é um direito essencial de todo ser humano, e sim, uma conquista meritocrática que está "coincidentemente" de acordo com o interesse masculino-hetero-branco-cristão-etc. O que parece que querem dizer é que as mulheres tem total liberdade para protestar pelo direito de não serem mortas, desde que estejam caladas, em um salto alto, maquiadas e se comportando. E o movimento apela para nos fazer refletir sobre o machismo em cada um de nós, que muitas vezes nos surpreendemos conosco ao nos chocarmos com uma mulher com os seios de fora, pensando que talvez seria mais digno que as moças pegassem um pouco mais leve no que dizem, talvez porque não estejamos preparados para uma sociedade que lide com a mulher da mesma forma que lida com o homem.


Parabéns ao protesto, que deve continuar assim mesmo: provocativo e coerente. A marcha é sobre as V-A-D-I-A-S. É isso mesmo, essa é a palavra. As vadias são aquelas que têm quantas relações sexuais quiser, mas não só isso: também se vestem como se sentem a vontade, têm opiniões fortes, trabalham fora de casa, bebem álcool, dançam como querem, sentam como querem, entre tantos outros direitos que nossos antepassados nos fizeram acreditar que é exclusividade do mundo masculino. E ó, "marcha das princesas" não ia combinar muito com a causa não.

 "Eu não sou cachorra, sou princesa do Senhor"

Aquelas que prometem obedecer se não forem mortas. Sim, porque o pior é que existem, e talvez sempre existiram, mulheres que já se acostumaram com o "seu devido lugar". Aquelas que estavam assistindo as notícias sobre o protesto na tv (enquanto aguardavam ansiosamente o começo da novela) e se escandalizaram com esse termo, se sentindo muito mal representadas. As que não se importam que o marido conte uma piada que vai rebaixá-la ao mesmo tempo que joga sinuca com os amigos. As vadias são as mulheres mais livres, e que de tão livres nos obrigam a cochichar uma ofensa na nossa rodinha de amigos, para ver se ela volta pra gaiolinha. Como são sempre chamadas as mulheres que cruzam a linha? A que decidiu se rebelar de uma vez por todas, sair da cozinha e lutar pelo direito ao voto, ao trabalho, ao mesmo salário? A que decide não usar burca?  


Vadia!

Porque a mesma sociedade que prega que é preciso "se dar o respeito", é a mesma que concorda com o policial que diz que "mulheres que não se vestem feito vagabundas não seriam estupradas", e é exatamente esse o cerne da questão. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário